sexta-feira, 8 de maio de 2009

O ovo e eu ou como nasce um trauma


Nos programas de televisão, a cozinha é um lugar idílico. Nem o avental se suja. Na vida, óbvio, não é assim.


Bem, quando dou sorte, sujo apenas minha roupa. Pela tradição, sempre sobra bolo no meu cabelo. Não sei como isso acontece, mas creio que é porque a pia da minha casa não é adaptada a pessoas com 1,69m de altura. Minha coluna que o diga. Não uso cabelo longo, nunca tive cabelo comprido em toda a vida.


(Mentira: dos 16 aos 17 anos, usei cabelo um pouco além do ombro, bem pouco. Período em que estudava pro vestibular e sonhava ser hippie ou rebelde ou as duas coisas. Por isso, desenhava gatos pretos e luas redondas na calça jeans, pintava a bolsa com tinta guache e não ia a salão - eu mesma cortava o meu cabelo, o que me rendeu até mesmo novas amizades, iniciadas assim:


Menino desconhecido do colégio - Ei, que foi isso no teu cabelo?

Eu - Um espirro, aí passaram direto com a tesoura na minha franja

Menino desconhecido - Oh, sério, faz mais isso não. Ficou estranho pra caramba.


Enfim, assim que passei no vestibular, fui no salão e cortei o cabelo na orelha).


Bem, mais uma vez, havia bolo na minha franja. Existem coisas que são sempre recorrentes. Bolo na franja quando cozinho e sorvete na ponta do nariz quando peço três bolas de uma vez no casquinho.


É tradição minha mãe demonstrar um certo pavor quando resolvo mostrar ao mundo meus dotes culinários. Ela costuma sabotar meus planos de dominação da copa da casa. Isso porque minha ficha criminal possui alguns itens comuns à maioria das pessoas: quase destruir o liquidificador por duas vezes, explodir o microondas, derrubar massa de bolo no teto. Sim, eu sei que existe lei da gravidade mas foi porque, ah, depois explico.


Lá vai eu, garota de vinte e cinco anos, solteira, em plena sexta-feira de lua redondamente cheia, tomar por decisão ficar em casa e cozinhar. Um bolo de cenoura. Havia chegado do trabalho, depois de ter viajado para o Interior. Mas, uma pessoa determinada não desiste fácil. Como aprendi a lição da última vez, separei um recipiente para por os ingredientes, misturá-los, antes de jogar tudo no liquidificador. Descobri esse truque fabuloso depois de despejar várias xícaras de trigo, açúcar, ovos e cenouras no liquidificador, ver uma fumaça sair e deixar minha mãe perto do desespero.


Em seguida, antes de qualquer coisa, ralei as cenouras do jeito correto, sem ser em rodelas. Seis cenouras!! Vamos lá, relembrar os tempos em que se juntavam todas as mulheres da família na casa da minha avó para ralar côco pras comidas de São João. Imitei quase igualzinho. Peguei o computador e fui em busca da receita. Tava tudo lindo, ainda limpo e organizado. Até o ovo.


O ovo. Podre. Que eu não vi que estava podre. Achei que era a luz. Estava cinza porque a luz podia estar fraca, não é? Aí subiu o cheiro. Terrível. Depois de pingar umas gotas na pia. Cair um pouco em cima do açúcar. Dentro do recipiente! SOS! SOS! Enquanto eu estava lá, prostrada frente à tragédia, impassível diante do caos instalado, a voz da experiência me manda tirar com a colher o que caiu. SOS! SOS! Tocar naquilo com a colher. A minha mão. Chegar perto daquele monstro. SOS! SOS!


O primeiro ovo podre da minha vida. Afinal, embora não tenha sido criada como futura patricinha, não chamo palavrões (a não ser algumas interjeições de raiva aprendidas na época de velejadora), não sei arrotar e tenho bastante nojo de um monte de coisa. Tanto que meu paladar é restrito e não como coisas de consistência estranha. Aí me aparece um ovo estragado. Um arrepio. Um choro. Um desespero. De novo, de novo, e de novo.


E agora volta. Só de pensar. Nunca enterrei ovo para jogar em ninguém. Só levei ovo na cabeça da minha irmã, em Itamaracá, há uns dez anos. Também nunca fui a bailarina de Chico Buarque. Até hoje, caio muito. Meu joelho vive com hematomas, as roupas novas sempre atraem vinho ou gordura de queijo, tive caxumba, sarampo, cárie. Mas nada na vida havia me preparado para aquele ovo. Não poderia imaginar que era algo do tipo: cinza, gosmento, com o pior odor do mundo.


Vai ver que por isso o personagem mais chato de Alice No País das Maravilhas é um ovo. Que na música dos Dia das Mães, o avental suja de ovo. É pelo ovo podre que gritam "Golou o ovo" quando erram no esconde-esconde. É o ovo que aumenta o colesterol. Devia existir somente a clara, sem a gema. Deve ser ela que estraga tudo, com essa mania de querer estar no centro, gigante e amarelada, miniatura de lua cheia, toda pretensiosa. Por causa do ovo, tenho trauma de quando meu pai fazia meu mingau. Ele tentava me ludibriar. Só que eu percebia.


Ainda bem que começou a chover.

(Porque aí posso terminar de escrever algo que não tem nada a ver com minha ingênua falta de filtro)


P.S.: registro - o teclado do pc está descolando. Como pode?

2 comentários:

  1. Este comentário foi removido pelo autor.

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  2. kkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkk
    tb tenho umas experiências meio excêntricas com ovo. ovo realmente não é uma coisa muito simples de lidar não... quando a gente se encontrar no msn, gtalk ou nos emails da vida, eu te conto. hahahahahha
    =****

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