sábado, 5 de dezembro de 2009

Liberdade

Ainda vou ter uma gata ou uma filha que se chame Felicidade. Ela será sorridente e com alma tão pesada quanto uma pluma. Imensamente distraída, inoportuna, invasiva e aflita. Inquieta e inconsistente nos miados ou argumentações. Gorda como uma bruxa boa ou finíssima feito fada. Vai adorar todos os tons claros e todos os doces. Vai abençoar a vida, o outono, o inverno, a primavera e nem tanto o verão - faz muito calor e ninguém pode ser muito paciente enquanto pinga suor.
Felicidade amará muito e se dará bastante. Vai ser perder pelos caminhos e não será achada. Ela que vai saber encontrar o mundo. Chegar no mundo, delicada, quase muda. Ou atrapalhada e estabanada. Felicidade será linda.
----------
Amor é algo mais nosso que dos outros. Amor pode ser um cheiro, uma cor, uma sensação indescritível que surge junto com alívio. O que alívio tem a ver com amor? Porque alívio rima com paz, com serenidade e calma. E que é amor se não for isso? Ah, esqueci do danado do desejo. Essa sombra a nos perturbar. Ou essa luz para nos fazer achar engraçado amar.
---------
Budismo ensina que a morte é a resposta para todas as perguntas na vida. Vamos ampliar isso um pouco para questões menores que vida e morte. Quando não temos mais o que perguntar sobre algum assunto, dizemos que o assunto está morto.
Hoje, recebi a resposta para uma importante pergunta. A maior pergunta dos últimos tempos. A que importava. Pensaram que eu poderia até inventar mais perguntas. Todas teriam a mesma resposta. Sim, sim.
2010 é uma nova década, não é isso? Bem vindo.

quarta-feira, 2 de dezembro de 2009

My Blueberry Nights

Havia um monte de letra melosa.
O destino sempre me salva.
Página saiu do ar e sumiu tudo.


Ainda bem.

domingo, 22 de novembro de 2009

Sábado, ops, Domingo

Ao som de "Your Ex-Lover is Dead"

É que levei uma pancada na cabeça ontem e minha memória que já andava boa, piorou. Mas era sobre o primeiro fora que escutei na vida.

Live through this.

Eu sabia o nome dele completo também. Escapou dos registros. Fica pra depois.
Lembrei o quanto gosto de Stars e quanto me faz falta ter um cd com as coisas deles.

sexta-feira, 20 de novembro de 2009

Aos meus queridos – parte 01

Não gelo com beijos nem abraços. Aprendi a gelar com mãos dadas e posterior troca de olhares. Foi assim.

Segundo semestre de 1992. Desde cedo, fui chegada num rebelde. Ele tinha dez anos. Eu, oito. Ele, cabelos grandes, repetente. Eu, cabelos curtos e CDF que sentava na banca de trás por causa dele. O primeiro menino que pegou na minha mão. Porque não conta as dancinhas de São João. Magro, alto. Rosto meio comprido, meio misterioso. Até hoje sei o nome completo dele, decorado. Estava com data para ir embora e eu sofria todos os dias com sua partida. E com minha covardia em me declarar. Meu primeiro amor.

Estava na banca ao lado da minha. Eu segurava o apontador lilás que meu tio trouxera de alguma viagem. O apontador e meu lápis da Pequena Sereia. Ariel questionava o pai, oras. Não falei que gostava de rebeldia desde cedo? Ele queria o apontador.Tentou tomar da minha mão fechada. Os dedos dele sobre meu punho cerrado. Mão sobre mão balançando no ar. “Aêêê”. Por que os outros flagram esses momentos só para apressar o fim?

1993 chegou só saudade.

Só que a vida é uma desenrolar de nós. 2001. Ele foi para mesma escola que eu de novo.

- Ei, Mariana. Ele disse que te conhece de algum lugar.

- Eu mesma não.

- Conheço sim.

- Ele disse que ficou contigo em Itamaracá.

- Foi, foi sim.

- Sem onda, tá (Queria eu, queria eu)

O menino mais bonito do colégio inteiro. Alto, magro, cabelo curto e olhos claros. O jeito rebelde estava lá, porém mais doce. Os anos na Europa, provavelmente.

Dia de prova. Fui procurar meu nome na lista das salas. O nome dele lá. Será? Tomei coragem! Virei correspondente secreta, com fiéis aliados. Até descobrirem meu M. Golpe fatal. Passamos um recreio juntos, conversando. Só que não houve apontador de desculpa para mãos dadas. O frio na barriga estava destinado a outro menino magro, alto, de olhos claros. Eu não sabia. Nem ele, que mais tarde apareceu encantado por uma loirinha simpática, de olhos verdes.

Nunca mais vi de novo. Mas é graças a ele que mãos dadas sempre vão importar mais que um beijo.

quarta-feira, 18 de novembro de 2009

Recordações de uma aposta e de uma promessa

Porque eu não vou cortar meu cabelo por seis meses.
E nem vou explicar nada.
Quem quiser, que entenda.
Ou não.
O mundo fica chato se vem com legendas explicativas.
Ou cheio de notas de rodapé.
A vida é cheia de perguntas.
Por que é vida, oras?

Mas, fiz promessa. Cabelo sem ver tesoura por seis meses.
Já se foi.
Bem superado.
Nada como determinação.
Passei um ano sem comer frango e picanha.
Anos sem refrigerante.
Por que não posso ficar sem salão?

Tenho pavor de lua cheia. E céu estrelado.

Caro estranho leitor,

Se lhe incomoda meus escritos, não acesse. Que coisa!

-----------


Just like children sleepin'
We could dream this night away.
But there's a full moon risin'
Let's go dancin' in the light
We know where the music's playin'
Let's go out and feel the night.

Because I'm still in love with you
I want to see you dance again
Because I'm still in love with you
On this harvest moon.
When we were strangers I watched you from afar
When we were loversI loved you with all my heart.
But now it's gettin' late
And the moon is climbin' high
I want to celebrate
See it shinin' in your eye.

Because I'm still in love with you
I want to see you dance again
Because I'm still in love with you
On this harvest moon.

quarta-feira, 14 de outubro de 2009

Muito auspicioso!

Caro leitor,
Ou leitora.
Você existe? Pressupostos me dizem que não. Que interesse haveria para alguém perder seu precioso tempo com meus escritos desordenados? Rascunhos de imitação de Calvino ou de Lispector, como todos fazem? Cara pessoa inexistente, não vê que faço piada? E sequer tenho veia cômica?
Vamos fazer um acordo - escrevo sobre o que me incomoda, o que perfura meu coração e dilacera minha alma e você não se contorce sobre si ao me ler. Não me censura com seus olhares raivosos, de apertar as pálpebras e tensionar os ombros.
Vou ser tão sincera neste trato quanto você. Vamos fazer mais um aperto de mãos, fechar mais um negócio: se tiver que se dirigir a mim, faça com objetividade e de forma devidamente esclarecedora. Não há nada mais sem graça e previsível que ensaios de "Oh, até breve, Filomena, não há mais tanta pena para gastar. Não posso amor jurar se você não me deixa caminhar por mim'. Como se a pobre Filomena segurasse em algum calcanhar e tomasse conta de qualquer ser adulto, tão mais ou menos que ela. Não há nada mais ridículo que frases pela metade ou promessas compostas de ar, concorda?
Pessoa inexistente que finge me ler: Lili é personagem sumida. Se houve curiosidade por letras anteriores, dê-se conta de que ela jogou-se da Torre e voou. Para o chão, para outro mundo, para fora da tela. Ainda não se sabe. Agora, é a vez de Filomena. Quase uma Macaíba, Macunaíma, Macambira...aquela moça boba daquele livro que parece falar de estrelas.
Filó ou Meninha é uma moça bem boba. Que pensou ser esperta e se deu mal. Como qualquer garota ingênua que por, dois segundos ao mês, se acha esperta e comete uma bobagem maior do que cometeria em qualquer tempo em que não se desse conta de que haveria nela qualquer vestígio de inteligência. Às vezes, é melhor ser burro por completo que somente por algum tempo.
Pois que Meninha conheceu Vonzinho. Rapaz que se achava muito capacitado para todo e qualquer trabalho. Mais que os outros e muito mais que ela. Vonzinho ganhou tal nome porque o avô dele era do tipo que gostava de vampiros. Surgiu algo como Von da Silva.
Ah, mas você, pessoa que me lê, não vá jogar seu tempo fora com essas histórias. Até porque são personagens sem enredo, só apresentação.
Sabe o terror? O medo? Não surge do que está ali posto, surge do que pode vir a ser. Vamos deixar Filó quieta, bem quietinha. Em paz.

terça-feira, 29 de setembro de 2009

Estava de bobeira pela livraria em busca de um livro sobre Psicanálise e Contos de Fadas, já que não encontrava o de Borges sobre Seres Imaginários. Menina imatura é assim mesmo, vive de criar mundos fantásticos para brincar de jogo do contente. Eis que me deparo com vários títulos esquisitos direcionados ao público feminino.

Um deles tratava dos modos que as mulheres devem se portar num relacionamento. Misturava dicas que sequer minha avó daria a outros trechos traumatizantes dos quais fui poupada de recordar. Outro livro, muito interessante, explicava a questão das recordações negativas - o cérebro nos protege das lembranças amargas. Era em quadrinhos, falava sobre abuso emocional, dependência emocional (argumentava que, de fato, era dependência química), etc.

O que me chamou mais atenção e o qual não pude folhear (porque o amigo que esperava chego na hora) era um sobre as 10 mulheres que somos antes dos 35. Bem, estou até agora a imaginar quantas já fui, já que estou no ápice dos meus 25 anos.

(continua)

domingo, 27 de setembro de 2009

Kley e a gente


Há quase um mês, paguei a hospedagem completa num albergue em Porto de Galinhas. Minha e de uma amiga. Fizemos vários planos, preparamos trilha sonora pra estrada, ensaiamos até abrir espumante pra recepcionar uma outra amiga.


Aí Kley teve uma parada respiratória. Vi um atropelamento de uma criança pelo carro da frente. O menino correu na avenida do nada. Minha irmã desesperada e eu sem reação. Kley é internado. O carro, deixado na frente de casa por causa de tristeza, quase arrombado. Saio da oficina, bato numa moto. Minha mãe lembra dos sonhos da semana e deixo Porto somente pro domingo. Despacho Marilia pra lá. De choro, basta o meu. Ou choro por ela, ou por Kley. Por dois, é muito. E é melhor chorar na frente do mar que na frente da parede branca do quarto dela.


Fico em casa. Sem graça, abraçada nas gatas, triste. Sorte que tenho amigos. Muitos, maravilhosos. Anjos. Todos com carinho para dar numa hora que poderia ser banal para tanta gente. Era só um cachorrinho, já velho, já cego, já feio. Com mau cheiro. Que usava fralda descartável e acordava a casa toda todas as madrugadas.


Só que era Kley. Ele corria atrás de galinhas, corria para não apanhar dos gatos. Levou susto de sapo cururu. Achava que era um pastor alemão. Derrubava as roupas da minha mãe no chão quando ela não estava em casa. E tinha ciúme das mulheres da família.


Kley me salvou de namorar um carinha que estava nem aí pra mim. Uniu-se a Marilia e expulsou o dito cujo aos latidos agudos dele. Kley chegou numa caixa aqui em casa, amarelado, cor de caramelo, fofo. Dia 30 de agosto de 1993. Quarenta dias depois de nascer. Ele só gostava de ração de gato, fã de peito de galinha e chocolate. Fugia de casa apaixonado pelas cachorrinha da esquina. Tinha bigode bem tosado, em homenagem ao meu pai.


Kley era especial. Querido pelos meus amigos, pelos meus tios. Minha avó, que nem de bicho gosta, chorou. Ele foi tão doce que esperou minha mãe viajar pra poder partir. Pra poupá-la.
Kley, você foi pro céu dos cachorrinhos. Encontrar seu pai, Ícaro, sua mãe, Fada, e seus irmãos. Você foi levar alegria e bagunça pra lá. Arranjar umas namoradas e comer bem muito filé de peito de frango grelhado. A gente levou pra você na clínica, mas você queria o do céu, que era mais gostoso. Obrigada, meu cachorrinho, obrigada por tudo. Como disse ontem ao me despedir: todos nós amamos muito você.

terça-feira, 22 de setembro de 2009

A Torre

Despedida.

Nantes - Beirut

Well it's been a long time, long time now
Since I've seen you smile
And I'll gamble away my fright
And I'll gamble away my time
And in a year, a year or so
This will slip into the sea
Well it's been a long time, long time now
Since I've seen you smile
Nobody raise your voices

Just another night in Nantes
Nobody raise your voices
Just another night in Nantes

A Temperança

Às vezes, dá medo de escrever o que vem à cabeça. Só se eu tivesse certeza de que ninguém leria e que o que penso me abandonaria. Lili? Lili descobriu que era somente um personagem de uma historinha rascunhada. Sofreu, sofreu, chorou. Pensou em cortas os pulsos. E pulso de personagem sangra? Se sangra, causa morte? Ela não tem medo de morte. Tem medo de continaur existindo de fantasia. Ser fantasia é muito ruim. É muito pouco. É de mentira, eis o problema, em resumo. A fada boa de voz grave feito bruxa passou uma poção mágica para se aquietar e parar de histerismo desnecessário. Oras, todo mundo fica doido pelo menos uma vez na vida. Que coisa! Lili lembrou que não entrava no mar com medo de ser levada pelas sereias. Medo nada! Medo só de polvo e tubarão, que nem existem no mundo dela. Ela quer mais é sair do mundo dela e virar gente. O temor era esperança.
No mundo de Lili, sereia também não existe. Claro, né!
Ela ensaiou uma partida. O narrador confidenciou que espera. Talvez ela vá mesmo embora.

sábado, 19 de setembro de 2009

Medo de primavera ou Do Instinto

Não sei usar pronomes. Não sei dizer eu. Talvez porque minha marca esteja escancarada o tempo todo porque não paro nunca. Não descanso, não durmo. E para cada não que me dou, devolvo uns cincos sim. Ou não. Ou sim. Quem sabe? Importa, de fato? De que vale cada afirmação?
Quando escrevo, descanso. Durmo. Por isso, melhor ficar na torre, mais seguro. Que há de mim além do instinto? Além do inquieto, do inconstante, da vontade de deixar de ser uma para virar milhões e dividir os rastros de sentimentos dispersos, escondidos em cada ato mal empregado, em cada armadilha por esse eu montada? Se houver uma palavra para ser apagada, que seja eu. O nós alivia a culpa. Culpa de quê? Nós é bom – vale por dois e por todos os problemas. Que problemas? De fato, há algum?

Escrevo para concentrar os olhos num único ponto. E dar lugar para as mãos e dedos. As pernas que se contorcem entre cadeira e chão e coxas. As coxas que possuem vida própria e seguem o que lhes der vontade e prendem entre elas aquilo que lhes carece. A vontade que escurece e ilumina. Mais ilumina, por que vontade é sempre bonita.

Vontade é sempre leveza. Vontade é que tem razão. Vontade é um sorriso. Qualquer um. Desde que seja.

quinta-feira, 17 de setembro de 2009

Para todos e qualquer um


A maneira mais fácil de se saber se gostamos ou não de um filme ou de livro é quando nos percebemos envolvidos com os personagens. Ou seja, quando torcemos pelo final que desejamos. Quanto maior a vontade de ler um livro ou assistir tal filme, mais quero saber de como o enredo termina. Muitas pessoas estranham quando pergunto por quem morre. Uma amiga sabia que, por gostar de saber, eu gostava de contar, me pedia para eu não falar nada. Aí eu dizia:" A mocinha morre grávida no final". Ela batia em mim para depois me chamar de abestalhada e voltarmos aos risos. Cecília sempre acreditava.


Só que saber o fim da história me impediu de terminar um dos livros que mais me marcaram e inspiraram na vida: Memorial do Convento, de Saramago. Hoje, relembrei de Blimunda. Uma querida amiga precisava fazer um blog ilustrado. E escolheu o tema desejo. Discutimos logo Foucault e Freud. Nietszche ficou de fora, até porque nem sei se elas gostam ou leram. Eu mesma não li por puro medo, tudo que sei é do tanto que ouvi falar. No debate, também foram citados Hilda Hilst e Victor Hugo, com aquele texto bem bonito que virou música bem chata dos chatos do Barão Vermelho. Fernanda lembrou do adorável e belo Up - Altas Aventuras e eu de Blimunda.


Desejo é uma nuvem. Ao sabor do vento, a criar o vento. Vai e volta, desprendida, imprevisível. Livre. Quando acumulamos muito desejo, o desejo se transforma em chuva. Vira água. Escorre rápido e mais rápido ainda vai embora, evapora. As nuvens do desejo podem deixar o dia mais bonito ou mais cinzento. Será que é por isso que gosto tanto de tomar banho de chuva? Para lavar a minha alma dos quereres? Ontem, rejeitei o cuidado de dois cavalheiros e os deixei com o guarda-chuva. Dispenso sombrinha - nas minhas mãos, ou se perde ou se quebra, não possuem nenhuma serventia.


Meu desejo de agora? Não desejar mais o bolo de rolo de chocolate que minha mãe compra e me engorda. Muito. Porque sou muito criança para resistir à felicidade intensa e curta de um chocolate que escorre naquela massa fofinha açucarada.


Um desejo que não seja desejo, um sonho? Fazer um milk shake com ganache de chocolate amargo e sorvete de creme. Para depois testar o mesmo ganache com sorvete de chocolate da John´s. Acompanhados de um mega sanduíche de queijo polenguinho.


Ah, são desejos só meus. Que posso dizer que ninguém mais tem, só eu. Os outros, os outros são comuns de todos.


Indicação de leitura: Nina Chuva e Luna Clara & Apolo Onze

segunda-feira, 14 de setembro de 2009

Lili e o mundo

No mundo de Lili, todos os habitantes guardam num local bem especial e escondido o coração. Na verdade, é uma tábua. Cada vez que o coração é ferido, abre um buraco. Espaço que pode até ser tapado, mas fica sempre a marca, a cicatriz, do furo. Só que ali não é um lugar comum. É o país de Lili.Então, onde foi feito cada furo, que nunca poderá voltar a ser um espaço de madeira lisa da tábua, é meio que lapidado o buraco. Há um esforço para deixá-lo mais arredondado. Bem bonitinho.
Aí, aquele vazio passa a ser preenchido pelo doce favorito da pessoa dona do coração-tábua. No de Lili, os buracos são ocupados por tortas de morango, bolos de chocolate, trufas de chocolate amargo, picolé de limão, sorvete de chocolate. Tudo que ela gosta de chocolate. Até mesmo Milk shake que se toma de colher. As tábuas esburacadas e sem graça, no país dela, só ficam assim se o dono for bobo e assim quiser. Porque bom mesmo é que quando cada mágoa vira um doce, colorido, bonito e bem gostoso. Para comer lambendo o dedo e melando até a ponta do nariz.

Casa de mãe Joana

A objetividade é um dom. Seguir em linha reta, com precisão, Um dom. Organizar quarto e guarda-roupa, mantê-los ajustados, roupas estiradas, cabides bem pendurados.Não é coisa pra qualquer um. Uma amiga disse que deixamos gavetas e guarda-roupa igual à forma que deixamos nossas emoções. Meu quarto é um brinco. À força, porque ainda moro com meus pais. As gavetas, o caos. Não abra nunca a porta do meu guarda-roupa, pode desmoronar um mundo inteiro em cima de você. Nem ouse virar a chave que abre a porta que vai lhe dar acesso a mim. Ninguém sabe se lá abriga uma versão mais bagunçada da caixa de Pandora.

Mas vem cá? Não somos todos assim? Emaranhados, colchas de retalhos mal costurados? Quando criança, criei minha própria grife de roupas de Barbie - a Kolinha. Para quê usar linha e agulha, que complicava, enganchava e me fazia perder a ponta da costura? Cola Tenaz nas pontas dos tecidos que sobravam das costuras de vovó. Mais rápido e mais prático. Só não era à prova d´água. E ainda podia ter elástico por dentro.

Tem gente que ganha tempo pra desencavar aquilo que precisa por causa da organização. Por medo, desleixo ou sei lá o quê, jogo tudo em qualquer canto, passo por cima, acumulo. Deixo pelos espaços. Acho a bagunça uma coisa linda. Vai ver por isso nunca curti lego. Não dobrava, não desafiava a lei da gravidade, deixava tudo reto, alinhado, estruturado.

O bom é o desarranjado, o inesperado, o monstrinho. Feito aquele desenho animado do Natal - dos duendes e dos gnomos. Até hoje, não sei qual deles queria ser. Ah, e por que temos que escolher, excluir? O bom é tudo junto, misturado. Não abra a porta. Não torne a chave. Vai que Pandora se joga em cima de você.

terça-feira, 8 de setembro de 2009

Medo - 1/10000000

Eis que, obrigada, adquiro meu primeiro transportador compacto de arquivos. Na primeira vez que ouvi falar em pen drive, em 2005, pensei que era algum tipo de caneta especial armazenadora de arquivos e de ponta esferográfica nas cores azul ou preta. Foi com muita estranheza e desânimo que olhei para aquele pedaço de metal sem graça.
Até meus pais são donos de um transportador desses. Só comprei por pressão social. Com que cara entregaria um CD ou pediria para baixar o arquivo do email em tempos de mp...7, 10, 15, 55 (algo cuja utilidade ainda não foi decodificada pelo aparato cognitivo antiquado e tradicionalista). As melhores palavras saem dos meus dedos sob uma caneta e sobre papel. Bem ilegível.
Quando um filho meu pedir um aparato tecnológico desnecessário e alegar que todo mundo tem, vou perguntar se ele está registrado por todo mundo, fiho de maria não sei quem. Ai da minha filha se ousar alisar cabelo antes dos 18, com o dinheiro dos pais.
Atitudes só devem realmente ser tomadas em caso de necessidade urgente. Voltar ao lugar é tão difícil, desapegar-se é uma lição tão dura, redescobrir a desnecessidade é tão mais complicado. Vou abandonar meu celular com TV digital antes de passar ao menos cinco minutos em frente àquela mini tela. Em favor da revisão do meu carro, por ventura de mini/macro viagens. Porque é preciso querer ir embora para saber porque precisamos ficar.
--
Lembrar: Crônicas de um quase boato ou Catequismo atravessado no êxodo do Litoral Sul pernambucano.

segunda-feira, 31 de agosto de 2009

Fato do cotidiano


- Tem três Mariana Maciel

- A última, que tem Nepomuceno do lado. Essa. Eita! Apaga esse dependente!

- Apago, aqui a gente apaga, adiciona

- Melhor que orkut, né?

- Vem mais pra cá

- Agora, tem foto é?

- Cara de intelectual, humm.

- De nerd, né

- Mas dá pra ver que é você, mesmo que mude o cabelo

- É tirasse o moicano, né?

- Dava trabalho, e tinha que pedir sempre pra alguém fazer a trança

- Ei, esse dependente aí existe mais não. O último!

- Ah, tá. Olha, no sábado você faz pacote pro feriadão.

- Tá, venho sim. Oh, apaga esse dependente. Esquece não, rs. Tem troco pra cinquenta?

- Tem sim. Olha os DVDs

- E apaga esse dependente!

- Todos?

- Não, mainha fica, né? Nem quero e mesmo e se quisesse, mãe a gente não deleta do cadastro.



Digressão:



Provavelmente, todas as Mariana Maciel da locadora sou eu. Duvido que em Olinda exista mais de uma. Pode haver, sem dúvida. Mas, pelas minhas contas, sou as três. A primeira deve ser do cadastro da minha mãe. Que eu esqueci que existia e também, oras, sou adulta, devo ter o meu próprio nome na lista da locadora. Duas citações explicadas. A terceira, bem, eu era dependente de um ex aí. E o nome deletado? Um ex também.



Ou seja, mesmo depois de fazer toda a faxina energética - jogar um monte de cacareco bregoso fora, o meu passado amoroso resiste logo em um dos lugares onde mais afogo minhas mágoas e dores de cotovelo - na locadora. (Os outros lugares são beira mar de Olinda, Bacana da 12 de Março, casa das meninas, livrarias e algum bar de começo de noite).



Nos meus períodos pós-fora, além de passar por um certo isolamento nos finais de semana (é muito mais legal ingerir álcool na quarta-feira que na sexta), procuro refúgio nos livros (poucos) e nos filmes (muito). Ah, e no bom e velho vinho (bastante). Posso ser muderna como for, mas cerveja me parece bebida de ogro. Cheira mal, é de cor estranha, deixa gosto forte na boca e é totalmente sem charme. Se é pra dar uma de descolada e beber em garrafa, compro uma Ice, cujo teor alcóolico é semelhante.



Vamos lá, de volta. Que absurdo! Um resumo do meu passado lá, estampado, onde eu menos me lembraria, junto com todas as minhas preferências cinematográficas! Anotado junto do relatório das minhas referências imagéticas dos últimos sete, oito anos, sei lá.



Brilho Eterno de uma Mente sem Lembranças. Vou até voltar a ler o trecho de Tristão e Isolda de Pope.

sábado, 29 de agosto de 2009


A gente descobre que ama quando se pega a fazer algo surpreendente pelo outro. Quando se vai além de si mesmo motivado pelo outro. Aí sim, é amor.


A gata mais trelosa subiu no telhado e não soube descer. Superei meu medo de altura e meu desequilíbrio para passar uns 15 minutos no penúltimo degrau de uma escada enferrujada. Para ganhar em retribuição arranhões da bichana apavorada.

quinta-feira, 13 de agosto de 2009

Contemplação


Alguns filmes que puderam deixar algo em mim. Só para exercitar a memória. Ordem aleatória.


1) Brilho Eterno de uma Mente Sem Lembranças - pela bela possibilidade de esquecer o que fez bem para não muito depois fazer muito mal.


2)Encontros e Desencontros - porque deu o estalo necessário ao rompimento, quando não há mais comunicação.


3)Na Natureza Selvagem - o despertar para ganhar o mundo (e a mim mesma) sozinha. O renascimento do amor pelos momentos de solidão.


4) I´m Not There - deixou Bob Dylan mais perto.


5) A Malvada - porque nem sempre o algoz é tão algoz assim. Às vezes, quem pensa que é lobo não passa de cordeiro. Para me lembrar que mesmo que não se queira, de vez em quando somos, de fato, vítimas.


6) Bonequinha de Luxo - "Moon river and ... me". Precisa de mais?


7) Caramelo - poucos filmes mostraram de forma tão verdadeira o universo feminino. O filme que eu gostaria de ter feito, de ter participado de alguma forma.


8) O Jardineiro Fiel - porque uma vez por mês penso em fazer trabalho humanitário na África.


9) Desejo e Reparação - o fantástico universo do "e se..."


10) O Fabuloso Destino de Amélie Poulain, A Pequena Sereia, A Bela e a Fera, Procurando Nemo (por causa de Dory, claro), Coraline e o Jardim Secreto, alguns de Tim Burton, muitos de Linklater - simplesmente porque, oras!


terça-feira, 11 de agosto de 2009

Rupestro



“Mãe, a senhora tem um bom coração. Meu pai tem um bom coração. Minha irmã, Marilia, é meio estranha, mas tem um bom coração. Meu cunhado, Michael, também tem um bom coração. Meu cachorro Kley e as gatas Ferrugem e Dengosa (mesmo que não tenham sido assim batizadas) são animais de bom coração”.

Recordações de uma noite de lua cheia, regada a um delicioso vinho italiano frutado, para depois dar lugar a licor limoncello, caseiro e não menos delicioso.

Às vezes, precisamos quebrar barreiras. Por menores que elas sejam. Primeira vez na vida que vomitei por causa de bebida. O que não me permiti na adolescência veio agora. Antes tarde do que nunca.


sábado, 8 de agosto de 2009

Lua Cheia

Take the last train to clarksville,
And I’ll meet you at the station.
You can be be there by four thirty,’cause I made your reservation.
Don’t be slow, oh, no, no, no!Oh, no, no, no!

’cause I’m leavin’ in the morning
And I must see you again
We’ll have one more night together’til the morning brings my train.
And I must go, oh, no, no, no!
Oh, no, no, no!
And I don’t know if I’m ever coming home.

Take the last train to clarksville.
I’ll be waiting at the station.
We’ll have time for coffee flavored kisses
And a bit of conversation.
Oh... oh, no, no, no!Oh, no, no, no!



Take the last train to clarksville,
Now I must hang up the phone.
I can’t hear you in this noisy
Railroad station all alone.
I’m feelin’ low. oh, no, no, no!
Oh, no, no, no!

And I don’t know if I’m ever coming home.
Take the last train to Clarksville,
Take the last train to Clarksville

terça-feira, 4 de agosto de 2009

Eterno retorno


Ater-se ao presente. Sem perspectivas de um futuro impossível e sem as amarras de um passado nostálgico. Li isso numa crítica sobre a montagem de As Três Irmãs, elaborada em conjunto com um projeto de Coutinho. A peça é bastante especial para mim, foi lida duas vezes, seguidas, durante o primeiro período de faculdade. Num momento meio turbulento de adaptação à universidade após a saída do colégio. Moscou é o sonho distante, apego que dá um sentido mais doce àquelas mulheres e seus enredos.


O que seria o meu Moscou?


Ou melhor: será que preciso ou quero um Moscou?


Parece que, entre encontros e desencontros com os outros e com nós mesmos, somos levados pelo acaso a fazer escolhas impensadas. Nada que rime com impulsividade. O que abordo é diferente. Parece que aquilo que nos torna quem somos é o que acontece nas menores horas do dia. Quando nem pensamos em tomar decisões. Quando deixamos a vida seguir seu próprio curso.


Meu temperamento, minha ansiedade, minha necessidade de definição e de resolutividade de tudo me impelem a sempre querer tudos às claras. A ter respostas imediatas. Mas não é a vida um contínuo desenrolar de fatos e de acontecimentos? De sincronicidades que fazem saltar aos olhos os milagres dos pequenos assombramentos? Nossa esperanças e temores mais reclusos? A única coisa que está definida e certa é a morte. Ela é a resposta de tudo, para tudo. Porque é inquestionável e implacável. Não somente a morte de um ser. Mas a morte de qualquer coisa. De uma questão, de um amor, de um plano.


Então, vai ver que não sou assim tão desesperada por vida, porque a engulo o tempo inteiro para extrair dela algo que ela nunca vai me dar: respostas. A vida só nos traz mais dúvidas e ainda ordena: "Não perca aquilo que lhe entrego com tanto carinho por pensamentos tolos e mal elaborados, siga".


Vai ver que preciso aprender a amar a vida. Amar de verdade. Sem os percalços dolorosos da paixão, que cobra, incendeia, entontece. Vai ver que, agora, do alto dos meus vinte e cinco anos, eu esteja começando a engatinhar na minha própria arte de amar a vida.


Blog retorna. Feliz ano novo maia.

sexta-feira, 24 de julho de 2009

Aspectos gerais

O mito do grande amor é, pra mim, hoje em dia, uma acumulado de arquétipos, todos juntos de uma vez. É o mito de Eros e Psiquê misturado com o conto de Atlas. Mais uma pitada de Orfeu e daquela tal de Penélope. Isso pra mim, só pra mim. Quem quiser que faça sua própria misturada. Invente sua confusão.

Se algum homem vier se meter a besta e ousar fazer algum plano comigo com prazo de validade de expiração longa, que envolva as palavras “vida”, “amor” e “sempre”, além de um belo fora ganha de brinde um curso básico de cinema com títulos bastante interessantes. Só abro exceção aos meus amigos – seres masculinos que não me olham com intenções românticas e que já possuem um lado feminino bem resolvido (apesar da testosterona sempre presente de boa parte deles).

O dito cujo que falar perto de mim “futuro”, “casa”, “filhos” vai ter que assistir e ser sabatinado intensa e repetidas vezes os seguintes filminhos, no primeiro módulo

1) Prova de Amor (All the real girls)
2) Um cara quase perfeito
3) Procura-se Amy
4) Garçonete
5) O casamento de Rachel

Obs.: Por motives de força maior, estou com pequenos lapsos de memória e não torno a lista mais recheada.

quinta-feira, 2 de julho de 2009

Alta noite já se ia


Capítulo 2

Canção de Lili presa na Torre, perturbada por esperanças e temores. Sinais misteriosos pareciam dizer muito. Mas também poderiam ser sinais de nada. E agora?


Longe
(Arnaldo Antunes)

Onde é que eu fui parar

Aonde é esse aqui
Não dá mais pra voltar
Porque eu fiquei tão longe, longe
Onde é esse lugar
Aonde está você
Não pega celular
E a Terra está tão longe, longe
Não passa um carro sequer
Todo comércio fechou
Não tem satélite algum transmitindo notícias de onde eu estou
Nenhum e-mail chegou
Nenhum correio virá
Eu entre quatro paredes sem porta ou janela pro tempo passar
Dizem que a vida é assim
Cinco sentidos em mim
Dentro de um corpo fechado
No vácuo de um quarto
No espaço sem fim
Aonde está você
Por que é que você foi
Não quero te esquecer
Mas já fiquei tão longe, longe
Não dá mais pra voltar
Eu nem me despedi
Aonde é que eu vim parar
Por que eu fiquei tão longe, longe, longe, longe
Longe, longe, longe, longe

domingo, 28 de junho de 2009

Rapunzel cortou suas tranças porque não quer sair da torre


Lili, depois do descanso promovido pelo tédio dos que não querem enxergar aquilo que devem fazer, encontrou um papiro com algumas indicações. Provavelmente, ali estariam as tarefas ordenadas pelas três criaturas indesejadas. A primeira tarefa seria dar algum tipo de resposta criativa ao questionamento de um pensador do tempo antigo, de um outro mundo, totalmente desconhecido por ela. Um tal de Zenão, cheio de ideias estranhas e complicadas. Ela teria que dar um jeito bem engenhoso de fugir da própria sombra. Lili lembrou de Peter Pan e suas desventuras com a sombra lá dele. E se viu encrencada.
Uma outra tarefa era transformar-se num bicho estranho, um tal de suricato. Algo assim. E tirar a farpa do pé de um leão tristonha, que vivia isolado nas montanhas. E como Lili faria isso? Ela não sabia.
Serviria pó de pirl...alguma coisa? Haveria uma fada para dar uma mão? Um cogumelo encantado? Nada. Nenhum pensamento poderia ajudar. Lili não obteve resposta do amigo distante. Ela sentia calafrios quando pensava nele e imaginou que ele poderia estar em tantos apuros quanto ela. Sentiu raiva e agonia, por que ela poderia lhe pedir ajuda e ele sequer confiara nela? Existe rancor pra tudo neste e nos outros mundos.
Então, Lili resolveu fazer tudo ao contrário do que ela havia lido nos contos de fadas. Deveria encontrar algo que fosse o segredo daquelas três esquisitas. Percebeu que continuava no alto da torre ondas as bruxas a levaram. Lembrou de Rapunzel e suas tranças enormes, instrumento que facilitou a sua fuga com o príncipe amado. Lili, garota meio rebelde, meio dona de pensamentos demais, olhou para suas madeixas. Estavam na altura dos ombros, com pequenos suaves cachos nas pontas. Pensou naquele papo de regras e exceções. Não deu outra. Agarrou uma tesoura velha e enferrujada deixada por uma das mulheres (seriam elas as três moiras, as parcas?) e livrou-se de mais da metade do cabelo. Sabia ela que as tarefas deveriam ser dela somente. E que nenhum príncipe chegaria em seu auxílio.

segunda-feira, 22 de junho de 2009

trecho 1

“Ou como diria Zenão: por que é tão difícil fugir da própria sombra?”
(Vita Brevis, de Josteim Gaarder)

A gente pode fugir do que quer que seja, menos de nós mesmos. Sempre retornamos, de uma maneira ou de outra. Sabe a pedra que afunda e arrasta junto para o chão do mar? Uma grande amiga foi organizar o guarda-roupa. Um grande amigo veio de férias ao Recife. E ele nem se apercebe de férias.

Ela me devolveu dois livros, emprestados a uma colega de colégio, e um antigo diário, de quanto eu tinha 11 anos e o mundo nas mãos. Quem me dera ter a auto-estima daquela época. Em que espelho eu me via? Tão segura, tão decidida, tão certa de mim mesma. Aos 11 anos. E depois, me perdi? Nas fotos das viagens do colégio, eu nem apareço. Porque eu odiava sair em fotos. Me achava feia, horrorosa, bochechuda e com cara de idiota. Só tirava foto de paisagem. Meus pais pensaram que era invencionice minha, esquisitice. Minhas amigas acreditavam que era porque eu queria ser artista. Nada, me achava feia e só. E não queria ter raiva depois. Sem lembrar que usei aparelho. Com os álbuns nas mãos, lembrei das fotos que eu tirei. Nem nas máquinas dos outros eu suportava ter meu rosto registrado.
Vou guardar o diário. Vai ver eu era mais mulher aos 11 que a que me tornei aos 25. Queria conversar com aquela menina. Pedir desculpa por não ter me tornado médica, por ter perdido metade da coragem. Explicar à menina do diário de quando eu tinha oito anos que não deu para virar a militante rainha de passeatas. Me distraí no caminho. O mundo era mais palpável que agora.

E os livros? Megera Domada e Vita Brevis. Nem precisa dizer nada. Datam de 2000. Posso lembrar exatamente do sentimento de quando lia cada uma das duas obras. Onde estava. Ela também me entregou um artigo antigo da faculdade. Minha amiga sequer imagina a quantidade de pendências trazidas de uma só vez. Feito a chuva de hoje. Tão bonita, tão intensa. Deixou a avenida toda escura, sem luz. Aos 11 anos, eu teria pego velas para brincar a noite inteira e só reclamaria dos mosquitos.

O “isso foi” cheio de esperança das fotos, da nostalgia acalentadora, de mãos suaves donas do aviso: “isso passa, tudo passa”.
Daqui a cinco anos? Vou lembrar da chuva de hoje?

domingo, 21 de junho de 2009

Sexta-feira, na volta pra casa

A música certa, na hora certa. O rádio devia estar muito bem sintonizado.

Sometimes I feel like I don't have a partner
Sometimes I feel like my only friend
Is the city I live in, the city of angels
Lonely as I am, together we cry
I drive on her streets 'cause she's my companion
I walk through her hills 'cause she knows who I am
She sees my good deeds and she kisses me windy
I never worry, now that is a lie
Well, I don't ever wanna feel like I did that day
Take me to the place I love, take me all the way
I don't ever wanna feel like I did that day
Take me to the place I love, take me all the way
Yeah, yeah, yeah
It's hard to believe that there's nobody out there
It's hard to believe that I'm all alone
At least I have her love, the city she loves me
Lonely as I am, together we cry
Well, I don't ever wanna feel like I did that day
Take me to the place I love, take me all the way
Well, I don't ever wanna feel like I did that day
Take me to the place I love, take me all the way
Yeah, yeah, yeah
Hold me, oh no, no, yeah, yeah
Love me, I say yeah, yeah
(Under the bridge downtown)(Is where I drew some blood)
Is where I drew some blood(Under the bridge downtown)(I could not get enough)
I could not get enough(Under the bridge downtown)(Forgot about my love)
Forgot about my love(Under the bridge downtown)(I gave my life away)I gave my life awayYeah, yeah, yeah(Away)No, no, no, yeah, yeah(Away)No, no, I say, yeah, yeah(Away)
Here I stay.


A primeira da lista dos Red Hot.

domingo, 14 de junho de 2009

Sentidos dispersos

O jogo permanece montado em cima da cama. O incenso já apagou. Ainda não tive como pensar nas cartas. Movimentos que já estavam nas tiradas anteriores. Se João Neto pudesse ajudar. O Imperador caiu há muito. De repente, olhando enquanto escrevo, faz algum sentido. Cinco arcanos maiores. Metade. A última vez foi antes do meu aniversário. Mas os arcanos não se repetiram. Cartas de luz e de caverna. Por que Espadas? Se fosse pra escrever no diário, seria à caneta e já usei caneta demais ontem. Aqui as palavras saem mais rápido. Dispus em formato de círculo. Era uma partida extra. Aí termina com a Roda da Fortuna. O jogo permanece montado em cima da cama.
Perda de tempo separar Espadas e Copas. O Castelo dos Destinos Cruzados me deixou bem calada.
-----------
O clima é algo que realmente afeta o humor. Impressionante.

quinta-feira, 11 de junho de 2009

Toda Bêbada Canta ou Bom Senso Racional


Existe felicidade na solidão, a dois, a três e aos montes. Fora os mil e um outros tipos. Lembro que era uma segunda-feira de Carnaval, embaixo de muita chuva. Sandálias foras do pés. Nem nos importamos se aquela era uma rua no centro da cidade, se podia estar suja e nos fazer pegar algum tipo inconveniente de doença. A chuva purificava tudo. E valia qualquer dança, braços para o chão e pernas para o ar. Índios franceses, com penachos provavelmente made in China, recifenses, olindenses, paraibanos e paulistas juntos. Ali, nada importava. Só se deixar molhar por todas as milhares de gotas de água que caiam sem parar. Podia improvisar uma ciranda, podia andar míope sem conseguir decifrar direito o que se via. Valia rock misturado com samba e uns blues inventados. Até, quem sabe, tentar fazer uns passos de polca. Ou não é polca aquela dança russa complicada? Era segunda-feira de Carnaval e estávamos todas juntas – todas as Marias. Amizade de Carnaval dura a vida inteira.

Vai ver que pra amizade ser selada é preciso ritual. Casamento tem que ser na frente de juiz, nascimento na maternidade de no cartório. Amizade, menos formal, mas mais importante precisa de festa, de alegria, de história pra contar depois. E amizade vem sem jogo, sem mistério, sem tática de conquista. É algo que pertence ao reino do já foi. Quando menos se espera, estamos lá, de novo, dividindo tudo. Não precisa de frio na barriga antes de telefonar nem imagina se foi hora certa ou errada de chegar. É o arrebatamento mais doce do mundo. Mais querido. Pra nossos amigos que a gente olha e diz que é maravilhoso viver. E amar.

*Registro: originalmente, a letra de Toda Bêbada Canta, de Silvia Machete acompanhava o post. Depois, fiquei em dúvida entre essa e Bom Senso Racional, de Tim Maia. Ambas fizeram parte da trilha sonora da segunda acima descrita. Aí, bem, quem pensa que tem dois pássaros na mão, termina com os dois voando.

sexta-feira, 5 de junho de 2009

Sabedoria materna




Praga de mãe sempre pega. Conselho de mãe deve ser seguido. E por que não critério de mãe? Sim, critério feito e ordenado pela mãe. Nossas queridas e amadas eternas protetoras. No auge dos meus 25 anos de idade, com muita pompa e circunstância, passei para ela o bastão. Ela que decide, a partir de agora, os marcos da minha vida. Aqueles que ela sabe, claro. Ou que ela lembra. Claro que toda mãe, com um mínimo de proximidade de sua cria, possui uma vaga idéia dos principais marcos da vida da prole. Mainha só não lembra como nasci (cada regra tem sua excessão) porque ela estava em convulsão no momento. Para isso, existe meu amadíssimo pai que não se nega a narrar com detalhes a confusão que ele fez ao achar que convulsão e parada cardíaca são a mesma coisa e devem ser solucionadas com pressionamentos no tórax. Daí nasce o critério número 01. Se a mãe não sabe, é então porque não foi sério e urgente, logo não pode ser um marco na vida de ninguém.


Lembre-se do dia em que você tomou todas numa confraternização de trabalho, despertou dentro de si uma simpatia e espontaneidade até o momento inexistentes, fez coisas que não devia e sua mãe nem percebeu, então não foi nada tão grave. Principalmente, se você ainda mora com ela. Se detalhes da sua vida íntima lhe causaram problemas, geraram medo e ansiedade mas não foi preciso ter aquela conversa com sua mãe, pule. Vai ver que não foi até o fim, não é? Então, tecnicamente (como aprendi com um ex), não conta. Caso você tenha pego uma carona maluca sozinha ou com amigas, mas ninguém ligou para sua mãe pra pedir resgate, fique com as gargalhadas. Mais uma história pra contar. Então, corte logo da lista todos aqueles nomes masculinos que lhe tiraram o sono, provocaram náuseas, frio ou borboletas no estômago mas que não chegaram ao conhecimento de mamãe. Sinto muito, não foram tão importantes assim. Insônia só vale quando ela lhe socorre com um calmante. Ninguém mais autorizado no mundo a lhe fornecer remédios tarja preta que sua mãe. Ah, vinho e champanhe também contam. Contam dobrado se for durante festas de fim de ano. Conselho que vou dar pra minha filha.


Critério número 02. Se sua mãe diz que não foi namoro, vai você acreditar no cara e afirmar que foi? Veja, em quem suas amigas lhe ensinaram a acreditar? Não, não. Muito apegada a estatísticas e padrões para tecer análises abalizadas da minha vidinha, estipulei como regra que só chamo de namorado aqueles que meus pais conheceram. E que foram apresentados (item fundamental) como namorados. O resto, bem, é outra história. Só que mainha é fera! Numa conversa, ela fez a triagem das sobras do meu passado. Por isso, entreguei a ela a honra de selecionar os marcos e a lista de namorados que já foram. Do rol, um item não exatamente glorioso, caiu, para meu completo alívio. Talvez tenha sido até mais de um. E ela costuma incentivar namoros para me manter mais quieta! Mamis manteve-se no salto (baixo) e disse: “Mas minha filha, aquilo ali não era nem namoro, você só queria saber de sair com suas amigas”. Ponto. Quem quiser que vá discutir com ela. Não tenho maturidade e nem experiência pra isso. (Ok, ela casou no segundo namorado mas deve ter adquirido muita bagagem com minhas tias e com meu pai).


Critério 03. Guardo pra depois.




*A imagem do post pode ser obtida colocando "mãe moderna" no google imagens

quarta-feira, 3 de junho de 2009

Mr. Right? parte 2 ou Co-incidências 2

Pequeno registro. Deveria guardá-los para outro espaço, mas parece que vale a pena ser feito. Sincronicidade, de acordo com o que li por aí, são pequenos fatos que nos dão algum tipo de aviso. Muitas vezes, bons avisos. Do tipo: caminho certo, verde, siga.

No fim do ano passado, parei para prestar atenção na música abaixo. Tudo que eu precisava, no momento, era ouvir exatamente aqueles versos. Principalmente, o trecho: “Be good to yourself, 'Cause nobody else, Has the power to make you happy”. Até então, aquela era a canção do tchururu, tocada vez por outra na rádio favorita da minha mãe. Mas era à noite, era quase dezembro ou já dezembro. E foi um período bastante intenso. Somente um homem gay poderia ter escrito algo desse tipo. Perfeito para derreter qualquer mulher. Presente maravilhoso para qualquer moçoilo hetero. Provavelmente, ele escreveu a letra em homenagem a pessoas despedaçadas emocionalmente por qualquer ser de qualquer gênero que deveriam se deixar reconstruir.

Bem, se os machos heterossexuais fossem espertos o bastante, estariam cercados de confidentes gays. Haveria relacionamentos mais felizes. Homens gays conhecem o percurso para o coração de uma mulher de forma incrível. Tanto que, para eles, conquistar uma dama deve ser algo tão sem graça que eles se aventuram com rapazes. Bem, deve haver vários heteros gratos a George Michael por ter composto Heal the Pain. Eu mesma, uma pequena senhorita, agradeço imensamente.

Eis que, ontem, a música retorna aos meus ouvidos. Se antes ouvi me contentando somente com os conselhos de amigo que o carinha dá para a mocinha de coração partido, desta vez, fui melhor contemplada pelo universo. Sincronicidade. Pequenos fatos mágicos que dizem: pois é, acontece, viva, permita-se, abra-se.

P.S.: Com Sir Paul é melhor. Um raro caso em que a versão supera a original.
Heal the Pain (George Michael)

Let me tell you a secret
Put it in your heart and keep it
Something that I want you to know
Do something for me
Listen to my simple story
And maybe we'll have something to show
You tell me you're cold on the inside
How can the outside world
Be a place that your heart can embrace
Be good to yourself
'Cause nobody else
Has the power to make you happy
How can I help you?
Please let me try toI can heal the pain
That you're feeling inside
Whenever you want me
You know that I will be
Waiting for the day
That you say you'll be mine
He must have really hurt you
To make you say the things that you do
He must have really hurt you
To make those pretty eyes look so blue
He must have known
That he could
That you'd never leave him
Now you can't see my love is good?
And that I'm not him
How can I help you?
Please let me try to
I can heal the pain
Won't you let me inside?
Whenever you want me
You know that I will be
Waiting for the day
That you say you'll be mine
Won't you let me in?
Let this love begin
Won't you show me your heart now?
I'll be good to you
I can make this thing true
Show me that heart right now
Who needs a lover
That can't be a friend
Something tells me
I'm the one you've been looking for
If you ever should see him again
Won't you tell him you've found someone who gives you more
Someone who will protect you
Love and respect you
All those things
That he never could bring to you
Like I do
Or rather I would
Won't you show me your heart like you should?
How can I help you?
Please let me try toI can heal the pain
That you're feeling inside
Whenever you want me
You know that I will be
Waiting for the day
That you say you'll be mine
Won't you let me in?
Let this love begin
Won't you show me your heart now?
I'll be good to youI can make this thing true
And get to your heart somehow

terça-feira, 2 de junho de 2009

6th Avenue Heartache

Minha família tem tendência a problemas cardíacos. Ninguém tem câncer. É só colesterol alto, infartos fulminantes, anginas e coisas assim. Acho bom. Melhor coração rebelde que células estranhas e não muito bem intencionadas. Sou mais coração desritmado. Acelerado. Ou vagaroso.
Mente vazia não cria sapo. Nem elefante em sala de jantar. Blog perdeu espaço pra antologia de C. Meireles e o livro da Rolling Stones.

quinta-feira, 28 de maio de 2009

Detalhes tão pequenos de nós duas ou Penélope e seu primeiro drinque pink


Hoje, pela primeira vez, passados quase dois meses que peguei minha permissão para dirigir, meu pai me mandou ser cordial com alguém no trânsito. Deixei uma moça entrar numa rua e ela buzinou agradecendo.

- Aí você faz assim (som de buzinada leve), porque ela agradeceu. Então, você responde.

- Ah, pai, agora já posso cumprimentar os outros, não é?

Depois que começou a pegar carona comigo todas as manhãs, meu pai só reclamou comigo uma vez. Ops, três vezes. Uma porque passei num buraco. Duas porque freei em cima do carro da frente. Ele pediu pra avisar antes pra que ele não morresse do coração de manhã cedo. Informação importante: O expediente no trabalho é às 8h. Saio de casa no mais tardar às 6h30 (antes era às 6h10). Motivos claros.

A grande piada do dia em que peguei a habilitação é que me curvei (e esqueci do volante) para agradecer a um motorista. Destra por educação (fotos provam que nasci canhota), não poderia dar um sinal de “valeu” com a mão esquerda. Se eu estivesse na Inglaterra, teria sido poupada dos resmungos do meu pai, semelhantes ao do Capitão Nascimento (“Alguém lhe agradeceu? Alguém lhe agradeceu? Então, você não agradece a ninguém, ouviu!”).

Ontem, super segura depois dos elogios dele de que eu estava dirigindo como uma adulta, resolvo não voltar do trabalho para casa e vou com uma amiga espairecer no shopping. Parei no caminho, estacionei muitíssimo bem (tirando o fato de que não alinhei os pneus), vou por um novo percurso e chego lá, toda toda. E vem o momento de estacionar. Quinze minutos depois de muitos pra frente e pra trás, reclamo a falta de pessoas de boa vontade para ajudar. Os céus ouvem minhas preces e surgem senhora e filha super simpáticas para dar aquele help na manobra. Desço do carro, entrego as chaves e ainda peço para colocar de ré na outra vaga. “Porque tirei a carteira agora e não iria saber sair”. A boa ação foi feita pelas duas mulheres, porque se fossem homens iriam dizer gracinhas e não seria boa ação, seria divertimento alheio.

Animadíssima com minha aquisição da Antologia Poética de Cecília Meireles e de uma coletânea de entrevistas da Rolling Stones (apropriada pelo meu pai, fazer o quê se ele tem bom gosto?), sigo para casa de farol aceso, quinta marcha engatada, a 80 Km/h, contente e saltitante (afinal, reduzir marchas ainda é um problema). E, responsavelmente, vou completar o tanque. Penélope não fica de copo pela metade, criando peixe. Muito chique, também só bebe destilado amarelinho.

- Moça, quer checar o radiador e o óleo?
- Só o radiador. Onde abre o capô, moço? (Tenho trauma porque vi um dia um celta - ou seria um fiesta, não lembro mais-, a fumaçar e a queimar mão de gente porque o deixaram sem água. E olhe que ali havia uma setinha que não existe no meu mostrador!!! Pelo menos que eu tenha percebido). Detalhe: aí, o frentista percebeu meu analfabetismo funcional*.

- Tem que colocar um líquido rosa, porque já baixou.
- Ta certo.
- É R$18,50.

E lá vou eu. Feliz, comemorando com Penélope sua evolução de destilados amarelos para drinques coloridos. Toda orgulhosa, conto a meu pai dos acontecidos.

Bem, o resto. Ele abandonou a versão Capitão Nascimento e foi meio House. Terminei a noite lendo o manual do carro*.

* Linguagem automobilística é muito complicada, com desenhos estranhos e palavras esquisitas. O que danado é um relé??? Só conheço ralé. Todo analfabeto funcional tem vergonha de se acusar. Eu já tinha derrubado a máscara na hora em que falei que não sabia abrir o capô. Não iria ligar pro meu pra perguntar nada. Veja só, Cosma era uma mulher forte, mulata robusta, que votava na seção em que fui mesária por quatro anos. No início, ela aceitava melar o dedão e carimbar no lugar da assinatura. Na última vez dos meus préstimos lá, Cosma já copiava o nome dela. No lugar do dedão, desenhava letra por letra as palavras que estavam abaixo. Bem, Cosma é minha desculpa. Mal ajambrada, mas, enfim.

quarta-feira, 27 de maio de 2009

Você não serve pra mim



Aviso: Dedicado aos que me chamam de chata. A melhor forma de exorcizar um trauma parece que é assumi-lo.


Deve ter sido culpa do meu pai. Quem mandou nascer numa cidade que fica a 12 horas de carro de onde moramos? A cada viagem ao Crato, além dos travesseiros na parte de trás para mim e minha irmã, outra parte do ritual era colocar duas cassetes: uma de Beatles e Rolling Stones, outra de Roberto Carlos. Engano. Ainda havia a de Maria Bethânia interpretando RC. Nunca fui com a cara de RC. Com aqueles cabelos estranhos, aquele amontoado de fãs, as músicas recentes sem força, sem raiva, sem intensidade. Branco e azul monótonos. Chico Buarque é muito legal e bonito, mas prefiro a polêmica inconseqüente de Caetano. Ou isto ou aquilo. Precisei me render. RC é responsável pela maior parte da trilha sonora da minha vida. Não por escolha minha. É involuntário. Veio no sangue.

A percepção disso veio aos poucos. Primeiro, quando discuti a preferência de um amigo meu por RC. Notei que sabia a maioria das letras. Depois, naqueles momentos de crise. Só surgia Fera Ferida na cabeça. Em dias de TPM, Pode vir quente que estou fervendo, Você não serve pra mim, Se você pensa. Problemas por causa dos meus impulsos de ariana: Sua estupidez. Embora isso tudo, RC não representava para mim nada que correspondesse a meus critérios (parcos) musicais, muito menos de estilo. Não supria minha advertência chatíssima e preconceituosa erguida contra tudo que tocasse muito em rádios, bares, cenas de novela, etc.

Afinal, os principais caminhos para o nascimento do meu abuso trucidatório e impiedoso contra qualquer expressão cultural é me deparar com o produto em perfis de orkut, trilhas sonoras de novela da Globo ou achar bobagens semânticas na composição. Exemplos recentes (e óbvios até demais): a música que diz “Numa noite estranha, a gente se estranha” e aquela outra que cita passo a passo como mulheres imaturas ainda se acham adolescentes inseguras e ficam repetindo numa monotonia sem fim “Coisas que eu sei”. A primeira pelo menos me arranca risos, a outra me faz suspirar de impaciência. "Pintei meu cabelo, me valorizei" é mais honesto, portanto, menos ruim.

O que dizer, então, de RC? Unanimidade maior entre as grandes unanimidades nacionais da MPB? Estampado em pôster na casa da tia da minha mãe, amor maior de Teresa, a maluquinha que trabalha lá em casa, autor dos versos enviados em bilhetinhos amorosos por um professor da faculdade para suas namoradas? Preciso dizer a meu abuso que tentei. Tentei bastante. Mas, preciso curvar-me ao rei. É, Roberto, é a você que recorro várias vezes em momentos essenciais da minha existência. Ou nem tão essenciais assim. Só não espere que eu encerre o texto dizendo “O importante é que emoções eu vivi”. Tá. Devo-lhe essa concessão. É piegas. Só que é preciso baixar a guarda de vez em quando. Manter sempre os muros da torre levantados é um gasto danado de energia. Ainda mais quando determinadas portas permanecem sempre abertas. Mil perdões, RC, você serve, e como, pra mim.

Uma das favoritas:

Se Você Pensa
Roberto Carlos
Composição: Roberto Carlos / Erasmo Carlos

Se você pensa que vai
Fazer de mim
O que faz com todo mundo
Que te ama
Acho bom saber
Que prá ficar comigo
Vai ter que mudar...

Daqui prá frente
Tudo vai ser diferente
Você tem que aprender
A ser gente
Seu orgulho não vale
Nada! Nada!...

Você tem a vida inteira
Prá viver
E saber o que é bom
E o que é ruim
É melhor pensar depressa
E escolher antes do fim...

Você não sabe
E nunca procurou saber
Que quando a gente ama
Prá valer
Bom é ser feliz e mais
Nada! Nada!...

Se você pensa que vai
Fazer de mim
O que faz com todo mundo
Que te ama
Acho bom saber
Que prá ficar comigo
Vai ter que mudar...

Daqui prá frente
Tudo vai ser diferente
Você tem que aprender
A ser gente
Seu orgulho não vale
Nada! Nada!...

Você não sabe
E nunca procurou saber
Que quando a gente ama
Prá valer
Bom é ser feliz e mais
Nada! Nada!...

Daqui prá frente
Tudo vai ser diferente
Você tem que aprender
A ser gente
Seu orgulho não vale
Nada! Nada!...

Você não sabe
E nunca procurou saber
Que quando a gente ama
Prá valer
Bom é ser feliz e mais
Nada! Nada!...

terça-feira, 26 de maio de 2009

As soon as

E se não houvesse horários? Se a gente pudesse sair correndo na hora que as pernas começassem a se debater histericamente. Correr adiantaria? E se a gente pudesse ouvir Head On, do Jesus and May Chain, bem alto, seguido de Sacrifice do Motorhead, bem alto, aos pulos. Haveria pulo para dar conta? Haveria corpo para expandir até a energia ir toda embora? Corpo de gente é coisa rígida, seca, inviável para certas manobras. Bem que eu queria ser a Mulher Elástica.

E se houvesse uma lei que liberasse todos para banhos de chuva em dias de semi-tempestade? É que no Recife e em Olinda não existem tempestades. Só toró. Haveria tempo que bastasse?

Subverter os prazos. O tempo engole a gente e a gente só percebe quando já foi tempo demais. Abre os olhos, menino! Presta atenção, menina. Anda, anda, anda. Já é quase junho. Já é bem fim do ano.
Lista de músicas preferidas.
1) Moon River
2) Head On

domingo, 24 de maio de 2009

Co-incidiências

Porque às vezes é muito bom ouvir rádio. Melhor que ativar ordem aleatória no Media Player. A surpresa é bem maior.
E quando eu estiver triste
Simplesmente me abrace
Quando eu estiver louco
Subitamente se afaste
Quando eu estiver fogo
Suavemente se encaixe
E quando eu estiver triste
Simplesmente me abrace
E quando eu estiver louco
Subitamente se afaste
E quando eu estiver bobo
Sutilmente disfarce
Mas quando eu estiver morto
Suplico que não me mate, não
Dentro de ti, dentro de ti
Mesmo que o mundo acabe, enfim
Dentro de tudo que cabe em ti
E quando eu estiver triste
Simplesmente me abrace
Quando eu estiver louco
Subitamente se afaste
Quando eu estiver fogo
Suavemente se encaixe
E quando eu estiver triste
Simplesmente me abrace
E quando eu estiver louco
Subitamente se afaste
E quando eu estiver bobo
Sutilmente disfarce
Mas quando eu estiver morto
Suplico que não me mate, não
Dentro de ti, dentro de ti
Mesmo que o mundo acabe, enfim
Dentro de tudo que cabe em ti
(Nando Reis e Samuel Rosa)

quarta-feira, 20 de maio de 2009

Futuro do Pretérito

Lili não sabia patavinas do que faria com aquele desafio ridículo. Resolveu escrever a um velho amigo com quem havia tido briga monumental, uns tempos antes. Ele era perito em charadas, enigmas e quetais. Mas, como poderia convencê-lo de que ela realmente estava arrependida das grosserias que cometera? Por ser um velho amigo, guardava modos estranhos, ranzinzas e carrancudos. Era um ser de chamar atenção. Possuía um buraco, uma depressão, no espaço que ficava entre o peito e o estômago. Será que ele era meio-irmão do homem de lata do Mágico de Oz? E aquele espaço era na verdade alguma porta de entrada para algum mecanismo auspiciosamente elaborado? Ela começou a pensar na carta que escreveria para argumentar a favor da ajuda do tal amigo na árdua missão.


“Se um dia a gente fosse se encontrar pra falar besteira, para desviar a atenção do que é sério e, por isso, bem menos importante, seria assim. Eu iria a sua direção. Você me abraçaria, eu grudaria meu rosto no seu colo. Você passaria uma mão na altura dos meus ombros e com a outra alisaria meu cabelo e beijaria minha cabeça. A essa altura, eu já estaria chorando. Aí você diria que não tem mais o porquê de tanto choro, as tarefas difíceis vão se resolver logo depois que eu descansar. Feito passe de mágica. Aí, de acordo com minha imaginação, é nesta hora em que me afasto. Digo que sou manteiga derretida e pronto. Que choro por tudo. Para tentar disfarçar a importância do encontro. Mas, se você acha tudo diferente e desprovido de lógica, invente outro encontro mais interessante, com direito a lista de passatempos e de brincadeiras...”

terça-feira, 19 de maio de 2009

Coisas de ontem

1)
E estava lá no jornal. Os dois amigos. De um lado, a menina que estava doente e se curou. Do outro, o que estava sadio e foi morto. No mesmo dia, quase na mesma página. A morte onde era vida e a vida onde se temia tanto a morte. A gente nunca sabe o que está por vir. De repente, muda tudo. Às vezes, volta para o mesmo lugar, outras segue por caminhos que nunca esperamos.
Durante o caminho, a gente cria artimanhas para brincar com a sorte. Repete o mesmo cacoete para ver se vinga. Se o destino ajuda, se a fortuna sorri pra gente. Gosto do nunca porque o nunca, nunca é. Ou então o “por um bom tempo”. Que se resolve em menos de um mês. Em 15 dias. Uma semana.

2)
Sentimento quando é bom, de puro sangue, não precisa se explicar em palavras. Na verdade, usa as palavras de desculpa. Para não deixar o silêncio se tornar reinante. Já se viu ter que explicar o que se sente? Então era razão. Porque se não fosse assim qual sentido da expressão “razão de ser”? Razão é algo tão assim assado que para ser tem que se explicar, já nasce se desculpando, pedindo licença, com justificativa assinada e protocolada.

É que nem procurar no dicionário significado de epifania. Deixa lá o Aurélio ter a dele e a Clarice com a dela. Que coisa!

Dias de chuva possuem contratempos, mas só na chuva tem arco-íris. E quem nunca tentou passar debaixo não sabe o que é alegria
.

terça-feira, 12 de maio de 2009

Tarefas para Lili

As senhoras estranhas deixaram um bilhete, encontrado no comecinho da manhã por Lili. A garota, um tanto quanto inquieta, achou que deveria haver um exército de meninas parecidas com ela. Todas lilis. Todas inquietas e avexadas. Todas completadores de frases dos pensamentos dos outros. Ela seriam tantas e tão falantes que só com o barulho de suas vozes venceriam as três esquisitas.
O pedaço de papel dizia assim;
"Antes de qualquer coisa, senhorita, bom dia, viu! Garantimos que você se ocupará bastante e conseguirá diminuir a quantidade de minhocas que habitam essa cabecinha. Vamos lá. Como primeira prova, você terá que descobrir o grande segredo das exceções das regras. Vamos ver como você se comporta. Dica importante. Seja estratégica: primeiro, descubra o segredo, depois, o que queremos dele. Pense, menina, pense"

Cantoria

Um dia ainda pego o CD do meu pai.

---


É a luz do sol que incandeia
Sereia de além-mar
Clara como o clarão do dia
Marejou meu olhar
Olho d'água, beira de rio
Vento vela a bailar Barcarola do São Francisco
Me leve para amar
Eu, em sonho um beija-flor
Rasgando tardes vou buscar,
Em outro céu,
Noite longe, noite longe
Que ficou em mim
Quero lembrar
Era um domingo de lua
Quando deixei Jatobá
Era, quem sabe, esperança
Indo a outro lugar Barcarola do São Francisco
Veleja agora no mar Sem leme, mapa ou tesouro
De prata o luar

segunda-feira, 11 de maio de 2009

Lua cheia amarelada admirada do Carmo, em quase completa solitude

Para todo sentimento que nasce é preciso bastante atenção. Muito, muito carinho. Bastante cuidado. E uma bela dose de inteligência. Ou melhor, de generosidade. Porque se pensarmos um pouquinho, sabe mais quem sabe se dar.
O exercício magnífico de doação de si mesmo exige uma série de preparos. Racionais e discretos. Discretos porque se a estratégia é descoberta, o encanto vai embora. Ah, há que se buscar a razão para o encanto. A razão do encanto. Nada de atos violentos de jogar-se. O magnífico surge aos poucos, cativa aos montes por vir assim, devagar. Tal qual movimento de bicho que dá o bote quando menos se espera.
(em construção)

domingo, 10 de maio de 2009

O Monstro do SE

E se não houvesse sonhos que parecem dizer coisas? E se não houvesse músicas certas tocadas nas horas erradas? E se não houvesse coincidências? E se não existissem sinais mágicos do universo? E se não existisse tanta impulsividade? E se todo o mundo se resolvesse num único segundo e depois fôssemos viver de festa? Seria aproveitada a festa? E se toda vez que procurássemos algo realmente achássemos? E se toda vez que não estivéssemos olhando por nada, nada fosse o que aparecesse?
E se a Argentina ou a Espanha fossem perto uma da outra e na esquina da minha casa? A Itália também, não seria nada mal. E se eu soubesse exatamente agora o que fazer? Se surgisse um plano na minha frente?
Se a vida não viesse assim aos montes, aos tantos, o tempo inteiro. Se a gente resistisse ao convite e não fosse. Se o baile parecesse meio cheio, meio chato, meio sem graça. E se chovesse agora e a lua cheia sorrisse com o sorriso assustador do gato de Alice? Mas eu nem gosto daquele conto. E se eu fugisse e ninguém me achasse? E se a gente esquecesse tudo? E voltasse pro começo, sem casa, sem muro, sem crise financeira.
A gente ainda seria a gente? Se todos os se fossem diferentes. E a gente escolhe, assim, sem saber, sem ter opção clara? E segue e segue e pronto? E vai gente, vem gente, que fica da gente? Desta gente, daquela e da outra ali? É como aquele baile do filme, em que o tempo passa e ninguém fala. Só dança.
É quase clichê, hit de rádio. Mas é bonito. Ou melhor: e é bonito.