Quando penso em melancolia, lembro do tapete verde felpudo que ocupava mais da metade da antiga sala daqui de casa. Era em cima dele que derramava minhas lágrimas de adolescente insegura (pleonasmo, não é?). É que chove muito hoje. E eu gosto mais de chuva que de dias de Sol. Muito simples o porquê.
Oras, Sol, em Olinda, faz todo dia. Calor é o tema mais recorrente daquelas conversas entre pessoas que se conhecem há mil anos mas possuem intimidade zero e pouquíssima empatia (diferente de simpatia, empatia é um milagre da comunicação que acontece entre dois seres, não muito raro mas tampouco comum). Falar do clima é a estratégia principal para ocupar vazios.
No Carnaval, tomei muito banho de chuva. E lembrava do que minha tia Sheila dizia: "Sinta como se cada gota fosse um pingo de Deus em você". Tomar banho de chuva é lavar a alma.
Lembro do dia em que cheguei do colégio, ainda a me refazer do primeiro fora, e fiquei no batente do portão, sentada, sem pensar em nada. Tirei a camisa e o tênis e deixei a água escorrer. Depois, fiquei girando em torno de mim mesma, de braços abertos. Sabia que não iria esquecer nunca aquela chuva.
Agora, para escrever, precisei acender a luz porque estava escuro. E é lindo ver a água descer pela janela. Imagino logo uma praia. Melhor que praia com Sol, praia com chuva. Um frio. O mar e o céu uma coisa só, indivisíveis. O vento forte.
Bênção
"É melhor ser alegre que ser triste
Alegria é a melhor coisa que existe
É assim como a luz no coração"
Vai ver que quando duas pessoas ficam em silêncio e acham uma maravilha o silêncio entre elas (se maravilha e não alívio), é porque existe bem muita coisa entre uma e outra. Embora existam vezes em que o silêncio entre duas pessoas é um monte de coisa que pede para ser posta para fora mas fica travada. Tem silêncio que é carinho, tem silêncio que é saudade, tem silêncio que é amor, tem silêncio que é medo.
Nada melhor que chuva hoje. Nada melhor.
(O CD novo de Madeleine Peyroux é melhor que o anterior e é excelente para dias de chuva)
Tu me emociona...
ResponderExcluirTexto transparente... lindo!
Lindo, Mari!! Que texto leve.. quase me fez flutuar...
ResponderExcluir(...)
ResponderExcluiro silêncio
foi a primeira coisa que existiu
um silêncio que ninguém ouviu
astro pelo céu em movimento
e o som do gelo derretendo
o barulho do cabelo em crescimento
e a música do vento
e a matéria em decomposição
a barriga digerindo o pão
explosão de semente sob o chão
diamante nascendo do carvão
homem pedra planta bicho flor
luz elétrica tevê computador
batedeira, liquidificador
vamos ouvir esse silêncio meu amor
amplificado no amplificador
do estetoscópio do doutor
no lado esquerdo do peito, esse tambor
Quando chove, tudo parece fazer tanto tempo...
ResponderExcluir