domingo, 28 de junho de 2009

Rapunzel cortou suas tranças porque não quer sair da torre


Lili, depois do descanso promovido pelo tédio dos que não querem enxergar aquilo que devem fazer, encontrou um papiro com algumas indicações. Provavelmente, ali estariam as tarefas ordenadas pelas três criaturas indesejadas. A primeira tarefa seria dar algum tipo de resposta criativa ao questionamento de um pensador do tempo antigo, de um outro mundo, totalmente desconhecido por ela. Um tal de Zenão, cheio de ideias estranhas e complicadas. Ela teria que dar um jeito bem engenhoso de fugir da própria sombra. Lili lembrou de Peter Pan e suas desventuras com a sombra lá dele. E se viu encrencada.
Uma outra tarefa era transformar-se num bicho estranho, um tal de suricato. Algo assim. E tirar a farpa do pé de um leão tristonha, que vivia isolado nas montanhas. E como Lili faria isso? Ela não sabia.
Serviria pó de pirl...alguma coisa? Haveria uma fada para dar uma mão? Um cogumelo encantado? Nada. Nenhum pensamento poderia ajudar. Lili não obteve resposta do amigo distante. Ela sentia calafrios quando pensava nele e imaginou que ele poderia estar em tantos apuros quanto ela. Sentiu raiva e agonia, por que ela poderia lhe pedir ajuda e ele sequer confiara nela? Existe rancor pra tudo neste e nos outros mundos.
Então, Lili resolveu fazer tudo ao contrário do que ela havia lido nos contos de fadas. Deveria encontrar algo que fosse o segredo daquelas três esquisitas. Percebeu que continuava no alto da torre ondas as bruxas a levaram. Lembrou de Rapunzel e suas tranças enormes, instrumento que facilitou a sua fuga com o príncipe amado. Lili, garota meio rebelde, meio dona de pensamentos demais, olhou para suas madeixas. Estavam na altura dos ombros, com pequenos suaves cachos nas pontas. Pensou naquele papo de regras e exceções. Não deu outra. Agarrou uma tesoura velha e enferrujada deixada por uma das mulheres (seriam elas as três moiras, as parcas?) e livrou-se de mais da metade do cabelo. Sabia ela que as tarefas deveriam ser dela somente. E que nenhum príncipe chegaria em seu auxílio.

segunda-feira, 22 de junho de 2009

trecho 1

“Ou como diria Zenão: por que é tão difícil fugir da própria sombra?”
(Vita Brevis, de Josteim Gaarder)

A gente pode fugir do que quer que seja, menos de nós mesmos. Sempre retornamos, de uma maneira ou de outra. Sabe a pedra que afunda e arrasta junto para o chão do mar? Uma grande amiga foi organizar o guarda-roupa. Um grande amigo veio de férias ao Recife. E ele nem se apercebe de férias.

Ela me devolveu dois livros, emprestados a uma colega de colégio, e um antigo diário, de quanto eu tinha 11 anos e o mundo nas mãos. Quem me dera ter a auto-estima daquela época. Em que espelho eu me via? Tão segura, tão decidida, tão certa de mim mesma. Aos 11 anos. E depois, me perdi? Nas fotos das viagens do colégio, eu nem apareço. Porque eu odiava sair em fotos. Me achava feia, horrorosa, bochechuda e com cara de idiota. Só tirava foto de paisagem. Meus pais pensaram que era invencionice minha, esquisitice. Minhas amigas acreditavam que era porque eu queria ser artista. Nada, me achava feia e só. E não queria ter raiva depois. Sem lembrar que usei aparelho. Com os álbuns nas mãos, lembrei das fotos que eu tirei. Nem nas máquinas dos outros eu suportava ter meu rosto registrado.
Vou guardar o diário. Vai ver eu era mais mulher aos 11 que a que me tornei aos 25. Queria conversar com aquela menina. Pedir desculpa por não ter me tornado médica, por ter perdido metade da coragem. Explicar à menina do diário de quando eu tinha oito anos que não deu para virar a militante rainha de passeatas. Me distraí no caminho. O mundo era mais palpável que agora.

E os livros? Megera Domada e Vita Brevis. Nem precisa dizer nada. Datam de 2000. Posso lembrar exatamente do sentimento de quando lia cada uma das duas obras. Onde estava. Ela também me entregou um artigo antigo da faculdade. Minha amiga sequer imagina a quantidade de pendências trazidas de uma só vez. Feito a chuva de hoje. Tão bonita, tão intensa. Deixou a avenida toda escura, sem luz. Aos 11 anos, eu teria pego velas para brincar a noite inteira e só reclamaria dos mosquitos.

O “isso foi” cheio de esperança das fotos, da nostalgia acalentadora, de mãos suaves donas do aviso: “isso passa, tudo passa”.
Daqui a cinco anos? Vou lembrar da chuva de hoje?

domingo, 21 de junho de 2009

Sexta-feira, na volta pra casa

A música certa, na hora certa. O rádio devia estar muito bem sintonizado.

Sometimes I feel like I don't have a partner
Sometimes I feel like my only friend
Is the city I live in, the city of angels
Lonely as I am, together we cry
I drive on her streets 'cause she's my companion
I walk through her hills 'cause she knows who I am
She sees my good deeds and she kisses me windy
I never worry, now that is a lie
Well, I don't ever wanna feel like I did that day
Take me to the place I love, take me all the way
I don't ever wanna feel like I did that day
Take me to the place I love, take me all the way
Yeah, yeah, yeah
It's hard to believe that there's nobody out there
It's hard to believe that I'm all alone
At least I have her love, the city she loves me
Lonely as I am, together we cry
Well, I don't ever wanna feel like I did that day
Take me to the place I love, take me all the way
Well, I don't ever wanna feel like I did that day
Take me to the place I love, take me all the way
Yeah, yeah, yeah
Hold me, oh no, no, yeah, yeah
Love me, I say yeah, yeah
(Under the bridge downtown)(Is where I drew some blood)
Is where I drew some blood(Under the bridge downtown)(I could not get enough)
I could not get enough(Under the bridge downtown)(Forgot about my love)
Forgot about my love(Under the bridge downtown)(I gave my life away)I gave my life awayYeah, yeah, yeah(Away)No, no, no, yeah, yeah(Away)No, no, I say, yeah, yeah(Away)
Here I stay.


A primeira da lista dos Red Hot.

domingo, 14 de junho de 2009

Sentidos dispersos

O jogo permanece montado em cima da cama. O incenso já apagou. Ainda não tive como pensar nas cartas. Movimentos que já estavam nas tiradas anteriores. Se João Neto pudesse ajudar. O Imperador caiu há muito. De repente, olhando enquanto escrevo, faz algum sentido. Cinco arcanos maiores. Metade. A última vez foi antes do meu aniversário. Mas os arcanos não se repetiram. Cartas de luz e de caverna. Por que Espadas? Se fosse pra escrever no diário, seria à caneta e já usei caneta demais ontem. Aqui as palavras saem mais rápido. Dispus em formato de círculo. Era uma partida extra. Aí termina com a Roda da Fortuna. O jogo permanece montado em cima da cama.
Perda de tempo separar Espadas e Copas. O Castelo dos Destinos Cruzados me deixou bem calada.
-----------
O clima é algo que realmente afeta o humor. Impressionante.

quinta-feira, 11 de junho de 2009

Toda Bêbada Canta ou Bom Senso Racional


Existe felicidade na solidão, a dois, a três e aos montes. Fora os mil e um outros tipos. Lembro que era uma segunda-feira de Carnaval, embaixo de muita chuva. Sandálias foras do pés. Nem nos importamos se aquela era uma rua no centro da cidade, se podia estar suja e nos fazer pegar algum tipo inconveniente de doença. A chuva purificava tudo. E valia qualquer dança, braços para o chão e pernas para o ar. Índios franceses, com penachos provavelmente made in China, recifenses, olindenses, paraibanos e paulistas juntos. Ali, nada importava. Só se deixar molhar por todas as milhares de gotas de água que caiam sem parar. Podia improvisar uma ciranda, podia andar míope sem conseguir decifrar direito o que se via. Valia rock misturado com samba e uns blues inventados. Até, quem sabe, tentar fazer uns passos de polca. Ou não é polca aquela dança russa complicada? Era segunda-feira de Carnaval e estávamos todas juntas – todas as Marias. Amizade de Carnaval dura a vida inteira.

Vai ver que pra amizade ser selada é preciso ritual. Casamento tem que ser na frente de juiz, nascimento na maternidade de no cartório. Amizade, menos formal, mas mais importante precisa de festa, de alegria, de história pra contar depois. E amizade vem sem jogo, sem mistério, sem tática de conquista. É algo que pertence ao reino do já foi. Quando menos se espera, estamos lá, de novo, dividindo tudo. Não precisa de frio na barriga antes de telefonar nem imagina se foi hora certa ou errada de chegar. É o arrebatamento mais doce do mundo. Mais querido. Pra nossos amigos que a gente olha e diz que é maravilhoso viver. E amar.

*Registro: originalmente, a letra de Toda Bêbada Canta, de Silvia Machete acompanhava o post. Depois, fiquei em dúvida entre essa e Bom Senso Racional, de Tim Maia. Ambas fizeram parte da trilha sonora da segunda acima descrita. Aí, bem, quem pensa que tem dois pássaros na mão, termina com os dois voando.

sexta-feira, 5 de junho de 2009

Sabedoria materna




Praga de mãe sempre pega. Conselho de mãe deve ser seguido. E por que não critério de mãe? Sim, critério feito e ordenado pela mãe. Nossas queridas e amadas eternas protetoras. No auge dos meus 25 anos de idade, com muita pompa e circunstância, passei para ela o bastão. Ela que decide, a partir de agora, os marcos da minha vida. Aqueles que ela sabe, claro. Ou que ela lembra. Claro que toda mãe, com um mínimo de proximidade de sua cria, possui uma vaga idéia dos principais marcos da vida da prole. Mainha só não lembra como nasci (cada regra tem sua excessão) porque ela estava em convulsão no momento. Para isso, existe meu amadíssimo pai que não se nega a narrar com detalhes a confusão que ele fez ao achar que convulsão e parada cardíaca são a mesma coisa e devem ser solucionadas com pressionamentos no tórax. Daí nasce o critério número 01. Se a mãe não sabe, é então porque não foi sério e urgente, logo não pode ser um marco na vida de ninguém.


Lembre-se do dia em que você tomou todas numa confraternização de trabalho, despertou dentro de si uma simpatia e espontaneidade até o momento inexistentes, fez coisas que não devia e sua mãe nem percebeu, então não foi nada tão grave. Principalmente, se você ainda mora com ela. Se detalhes da sua vida íntima lhe causaram problemas, geraram medo e ansiedade mas não foi preciso ter aquela conversa com sua mãe, pule. Vai ver que não foi até o fim, não é? Então, tecnicamente (como aprendi com um ex), não conta. Caso você tenha pego uma carona maluca sozinha ou com amigas, mas ninguém ligou para sua mãe pra pedir resgate, fique com as gargalhadas. Mais uma história pra contar. Então, corte logo da lista todos aqueles nomes masculinos que lhe tiraram o sono, provocaram náuseas, frio ou borboletas no estômago mas que não chegaram ao conhecimento de mamãe. Sinto muito, não foram tão importantes assim. Insônia só vale quando ela lhe socorre com um calmante. Ninguém mais autorizado no mundo a lhe fornecer remédios tarja preta que sua mãe. Ah, vinho e champanhe também contam. Contam dobrado se for durante festas de fim de ano. Conselho que vou dar pra minha filha.


Critério número 02. Se sua mãe diz que não foi namoro, vai você acreditar no cara e afirmar que foi? Veja, em quem suas amigas lhe ensinaram a acreditar? Não, não. Muito apegada a estatísticas e padrões para tecer análises abalizadas da minha vidinha, estipulei como regra que só chamo de namorado aqueles que meus pais conheceram. E que foram apresentados (item fundamental) como namorados. O resto, bem, é outra história. Só que mainha é fera! Numa conversa, ela fez a triagem das sobras do meu passado. Por isso, entreguei a ela a honra de selecionar os marcos e a lista de namorados que já foram. Do rol, um item não exatamente glorioso, caiu, para meu completo alívio. Talvez tenha sido até mais de um. E ela costuma incentivar namoros para me manter mais quieta! Mamis manteve-se no salto (baixo) e disse: “Mas minha filha, aquilo ali não era nem namoro, você só queria saber de sair com suas amigas”. Ponto. Quem quiser que vá discutir com ela. Não tenho maturidade e nem experiência pra isso. (Ok, ela casou no segundo namorado mas deve ter adquirido muita bagagem com minhas tias e com meu pai).


Critério 03. Guardo pra depois.




*A imagem do post pode ser obtida colocando "mãe moderna" no google imagens

quarta-feira, 3 de junho de 2009

Mr. Right? parte 2 ou Co-incidências 2

Pequeno registro. Deveria guardá-los para outro espaço, mas parece que vale a pena ser feito. Sincronicidade, de acordo com o que li por aí, são pequenos fatos que nos dão algum tipo de aviso. Muitas vezes, bons avisos. Do tipo: caminho certo, verde, siga.

No fim do ano passado, parei para prestar atenção na música abaixo. Tudo que eu precisava, no momento, era ouvir exatamente aqueles versos. Principalmente, o trecho: “Be good to yourself, 'Cause nobody else, Has the power to make you happy”. Até então, aquela era a canção do tchururu, tocada vez por outra na rádio favorita da minha mãe. Mas era à noite, era quase dezembro ou já dezembro. E foi um período bastante intenso. Somente um homem gay poderia ter escrito algo desse tipo. Perfeito para derreter qualquer mulher. Presente maravilhoso para qualquer moçoilo hetero. Provavelmente, ele escreveu a letra em homenagem a pessoas despedaçadas emocionalmente por qualquer ser de qualquer gênero que deveriam se deixar reconstruir.

Bem, se os machos heterossexuais fossem espertos o bastante, estariam cercados de confidentes gays. Haveria relacionamentos mais felizes. Homens gays conhecem o percurso para o coração de uma mulher de forma incrível. Tanto que, para eles, conquistar uma dama deve ser algo tão sem graça que eles se aventuram com rapazes. Bem, deve haver vários heteros gratos a George Michael por ter composto Heal the Pain. Eu mesma, uma pequena senhorita, agradeço imensamente.

Eis que, ontem, a música retorna aos meus ouvidos. Se antes ouvi me contentando somente com os conselhos de amigo que o carinha dá para a mocinha de coração partido, desta vez, fui melhor contemplada pelo universo. Sincronicidade. Pequenos fatos mágicos que dizem: pois é, acontece, viva, permita-se, abra-se.

P.S.: Com Sir Paul é melhor. Um raro caso em que a versão supera a original.
Heal the Pain (George Michael)

Let me tell you a secret
Put it in your heart and keep it
Something that I want you to know
Do something for me
Listen to my simple story
And maybe we'll have something to show
You tell me you're cold on the inside
How can the outside world
Be a place that your heart can embrace
Be good to yourself
'Cause nobody else
Has the power to make you happy
How can I help you?
Please let me try toI can heal the pain
That you're feeling inside
Whenever you want me
You know that I will be
Waiting for the day
That you say you'll be mine
He must have really hurt you
To make you say the things that you do
He must have really hurt you
To make those pretty eyes look so blue
He must have known
That he could
That you'd never leave him
Now you can't see my love is good?
And that I'm not him
How can I help you?
Please let me try to
I can heal the pain
Won't you let me inside?
Whenever you want me
You know that I will be
Waiting for the day
That you say you'll be mine
Won't you let me in?
Let this love begin
Won't you show me your heart now?
I'll be good to you
I can make this thing true
Show me that heart right now
Who needs a lover
That can't be a friend
Something tells me
I'm the one you've been looking for
If you ever should see him again
Won't you tell him you've found someone who gives you more
Someone who will protect you
Love and respect you
All those things
That he never could bring to you
Like I do
Or rather I would
Won't you show me your heart like you should?
How can I help you?
Please let me try toI can heal the pain
That you're feeling inside
Whenever you want me
You know that I will be
Waiting for the day
That you say you'll be mine
Won't you let me in?
Let this love begin
Won't you show me your heart now?
I'll be good to youI can make this thing true
And get to your heart somehow

terça-feira, 2 de junho de 2009

6th Avenue Heartache

Minha família tem tendência a problemas cardíacos. Ninguém tem câncer. É só colesterol alto, infartos fulminantes, anginas e coisas assim. Acho bom. Melhor coração rebelde que células estranhas e não muito bem intencionadas. Sou mais coração desritmado. Acelerado. Ou vagaroso.
Mente vazia não cria sapo. Nem elefante em sala de jantar. Blog perdeu espaço pra antologia de C. Meireles e o livro da Rolling Stones.